05.11. 2014
Emily AnthesPara a BBC Future
Ao começar a comer, meu prato é igual ao que já comi inúmeras vezes em restaurantes asiáticos. Um emaranhado de massa bezuntada em óleo em meio a fatias de galinha, com aroma de alho e gengibre. Mas aos poucos vou percebendo olhos. Glóbulos escuros em uma cabeça amarelada - tudo conectado a um corpo.
Não os tinha percebido antes, mas agora vejo que estão por toda a parte - meu macarrão está cheio de insetos.
Se não tivesse sido alertada, talvez tivesse passado mal. Mas estou fazendo parte de uma experiência na universidade de Wageningen, na Holanda. O instituto de culinária da universidade, liderado por Ben Reade e Josh Evans, tem o desafio de conseguir transformar insetos em pratos saborosos.
Eu e outros três gastrônomos estamos presentes para testar alguns dos pratos preparados. Cada um recebe um prato principal diferente. O meu é um macarrão com gafanhotos - muitos deles ainda estavam vivos pela manhã. O prato também tem uma pitada especial de larva de mosca.
No dia seguinte, Reade e Evans participam de um seminário mundial em entomofagia - a prática de comer insetos - com mais de 450 delegados.
Segundo os especialistas presentes, no ano 2050 o planeta terá nove bilhões de pessoas. O desafio maior das próximas décadas será suprir o mundo, sobretudo em países de renda baixa ou média, com proteínas animais. Para eles, o planeta não teria condições ambientais de sustentar um aumento da pecuária tradicional.
A solução ecológica seria comer insetos, que são ricos em ferro e zinco. A criação de insetos requer muito menos água do que gado. No caso dos grilos, a quantidade de proteína é 12 vezes maior do que o encontrado em um bife.
Os insetos também poderiam ser usados como substituto das rações animais baseadas em soja, outro produto cujo cultivo tem alto impacto ambiental.
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Insetos podem ser ótima fonte de proteína |
Além disso os insetos se alimentam de excrementos. Os próprios insetos podem ajudar a reciclar o material orgânico do planeta - enquanto produzem proteína comestível.
Os especialistas reunidos na conferência imaginam um mundo onde os supermercados terão alas especiais com produtos a base de insetos, e lanchonetes servirão "inseto-burgueres". Será que chegaremos a tanto?
Comida antiga
Entomofagia é comum em várias partes do mundo. Segundo a FAO, dois bilhões de pessoas no planeta se alimentam de insetos. No Japão, as larvas de vespas são populares; na Tailândia, formigas também são alimentos comuns. Em vários países africanos, cupins são fritos, defumados ou cozidos a vapor. Atualmente, há 1,9 mil espécies de insetos comestíveis.
Então por que temos tanto nojo dos insetos? A resposta mais simples, segundo o psicólogo Paul Rozin, da Universidade da Pennsylvania, é que os insetos são animais.
Qualquer animal que come outro - seja ele humano, gorila, iguana ou barata - tem hábitos alimentares restritos, e costuma se alimentar de uma quantidade pequena de espécies na natureza. No caso dos humanos, a associação direta que se faz com insetos é lixo, decomposição e doença.
A empresária Laura D'Asaro enfrenta o desafio de colocar insetos na alimentação diária dos americanos - e ainda fazê-los pagar por isso. Ex-vegetariana, ela descobriu os "prazeres" da entomofagia na Tanzânia em 2011. Hoje ela tem uma linha de produtos alimentícios baseados em insetos.
Ela conta que para reduzir o asco de muitos consumidores o segredo é vender produtos à base de insetos - e não o animal "in natura". Sua empresa, a Six Foods, vende salgadinhos à base de uma farinha feita de grilos.
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Algumas empresas na Holanda e EUA tentam vender insetos no mercado |
Alguns produtos têm até mesmo o nome do inseto distorcido de alguma forma, para evitar rejeições com base no nojo. Um dos alimentos é feito à base de larvas que vivem em colmeias. A Six Food não menciona a palavra "larva" com destaque em seus rótulos, preferindo o termo "inseto do mel".
Nos últimos anos, diversas empresas surgiram para tentar explorar esse nicho de mercado. Na França, existe a Ynsect; nos Estados Unidos, a Enviroflight; na Holanda, a Protix. Na África do Sul, um empresário está criando uma grande "fazenda de moscas", que pretende produzir sete toneladas de "MagMeals" - refeições a base de "maggots" (larvas de mosca).
Mas a resistência do público ainda é grande. Para muitos, a ideia de comer insetos só parece vantajosa se comparada a experiências horríveis. Uma pesquisa conduzida por Rozin mostrou que 75% dos americanos preferem comer insetos do que carne de cabra crua. Para 53%, comer insetos é melhor do que aguentar 10 minutos de dor moderada.
"Não é a pior coisa do mundo, mas é simplesmente algo que todo mundo prefere evitar", diz Rozin.
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