VINICIUS FOREVER – O
centenário de Vinicius de Moraes
Elenilson Nascimento
“Em homenagem póstuma, Vinicius de
Moraes é promovido a embaixador, mas, em Salvador, o poeta recebeu uma bela
homenagem numa festona em Itapuã.”
O compositor e poeta Vinicius
de Moraes, criador da Bossa Nova e morto em 1980, completaria 100 anos no
último sábado, 19/10, mas talvez não quisesse chegar a essa idade. “Não me
agrada a ideia de envelhecer, pois perderia o que as mulheres me dão”, disse em
sua última entrevista ao jornalista Narceu de Almeida. Mas, querendo ou não, as
homenagens nesta data foram maciças e tiveram o caráter intimista que
caracterizou a maioria das apresentações de um artista grandioso que fez parte
da revolução da música brasileira e a levou para o mundo.
Em uma homenagem(?) póstuma realizada
pelo Itamaraty, Vinicius foi promovido a embaixador (*essa reintegração de
Vinícius à diplomacia coincide com o aniversário de 30 anos de sua morte), pois
no ano de 1969, durante a ditadura militar, ele foi “aposentado compulsoriamente”
da carreira diplomática quando era 1º secretário. A “expulsão” do Itamaraty foi
consequência do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que exigia o desligamento de
“bêbados, homossexuais e vagabundos”. O ex-presidente Lula – malandro e
aproveitador de ocasião – classificou a aposentadoria prematura de Vinicius de
“aberração”. “O que estamos fazendo aqui é quase que um processo de reparação.
O Vinicius era um ser superior que, mesmo cassado, continuou crescendo”, disse,
querendo aparentar bom gosto e respeito pela literatura. Durante a homenagem,
Lula voltou a dizer que é preciso valorizar os “heróis” ao invés de “se
preocupar” com quem praticou torturas e assassinatos durante a ditadura.
Tirando essa repentina e tardia
“homenagem” (dispensável) em Brasília, vários museus abrigam mostras sobre sua
obra; salas de teatro em que foram declamados muitos de seus poemas celebram;
bares do Rio de Janeiro, habitats de um poeta irreverente, boêmio e tresnoitado
também foram os principais locais de homenagem ao poetinha. Uma das várias
festas de “aniversário” foi no bar Garota de Ipanema, em uma de suas mesas,
quando ainda se chamava Bar Veloso, Vinicius compôs com Tom Jobim a canção que
ainda permanece entre as mais famosas e ainda deu “emprego” a Helô Pinheiro.
Nas redes sociais, seu centenário foi
um dos assuntos mais comentados no Brasil e até o Google o homenageou com
um doodle em sua página inicial. Também surgiu na internet uma versão
revitalizada do portal de Vinicius de Moraes, que oferece acesso à multifacetada
obra do poeta, compositor, dramaturgo, letrista e crítico de cinema brasileiro.
Mas, sobretudo, uma das homenagens mais bacanas nesse dia foi mesmo dos
admiradores do poeta que se reuniram em uma praça na Praia de Itapuã, em
Salvador (BA), onde Vinicius morou alguns anos e eternizou em verso – mas que
hoje a praia está degradada pela incompetência dos poderes públicos e pela
violência no local.
Contudo, a praça que leva o nome do
poeta, em frente à casa em que viveu, que foi transformada em hotel e tem uma
estátua (que vive sendo pichada por vândalos) feita pelo escultor Juarez
Paraíso, que representou o poeta sentado na mesa de um bar, onde muitos
turistas tiram fotos “com” Vinicius genérico e, tradicionalmente, o fazem com
um copo de uísque na mão, e que encarna todo seu espírito boêmio. Uma de suas
frases mais lembradas é dedicada à bebida: “Amei e bebei uísque. Não digo que
bebais em quantidades federais, mas quatro, cinco uísques por dia nunca fizeram
mal a ninguém”.
E foi nesse bairro tradicional baiano e
amado pelo autor de “Soneto da Fidelidade”, que acontece o show “Tarde em
Itapuã”, das 16h às 18h, na Praça Vinicius de Moraes, no último domingo,
idealizado e produzido pela linda Luzia Moraes – uma das produtoras culturais
mais atuantes e interessantes de Salvador, além de esposa do cantor e
compositor Jota Veloso (primo de Caetano “antibiografia” Veloso).
O evento
gratuito e aberto ao público reuniu 12 artistas, que, segundo Luzia, “não
cantariam outra coisa além de Vinicius”. Entre as atrações Sidney Magal (*para
quem não sabe é primo de Vinicius) cantando “Minha Namorada”, música
feita para Gessy Gesse, ex do poeta. “Esse é o único nome nacional, as
outras atrações são a genuína MPB baiana”, contou Luzia.
A cantora Carla Visi interpretou
“Garota de Ipanema”. Inclusive, ela mesma, a agora não tão garota Helô
Pinheiro, estava presente ao evento. “A celebração foi bem bonita,
verdadeira, autêntica. Helô é linda mesmo, tem uma luz, uma energia boa, fiquei
muito impressionada com ela e sua beleza que é muito maior que seus olhos
verdes iluminados. Ela é boa e do bem… as músicas tiveram arranjos lindos, a
praça se emocionou muitas vezes, os artistas choravam, e o público cantava
junto, em coro, muito emocionante mesmo”, disse a produtora Luzia Moraes.
O compositor Firminho de Itapoã
apresentou o samba mais famoso de Vinicius, a música “Samba da Bênção”, cuja
letra ensina que “Para fazer um samba com beleza, é preciso um bocado de
tristeza”. O cantor Alexandre Leão interpretou “Regra 3”, e Stella Maris,
a linda “Canto de Ossanha” – que é citada no meu livro “Clandestinos”. No
encerramento, todos subiram o palco para relembrar “Tarde em Itapuã”.
A atriz Gessy Gesse, que foi casada
sete anos com Vinicius, lançou, durante o evento, o livro “A Minha Vida com o
Poeta”, pela editora Solisluna. Segundo ela, a obra é uma biografia de sua
própria vida “um livro verdade” sobre histórias que vivenciou ao lado de
Vinicius. “Eu descrevo Vinicius na intimidade, um lado dele que poucas pessoas
tiveram oportunidade de conhecer. Essa é uma biografia onde eu deixei
documentadas as minhas próprias memórias, não o artista que todos conhecem, mas
o Vinicius que eu conheci, seus medos e o que ele gostava de fazer, além de
alguns segredos. Vinicius foi um excelente companheiro”,explicou Gessy.
O primo Magal falou também sobre as
lembranças do artista e da importância do poeta para a música. “Nem todas as
pessoas sabem, mas eu sou primo de Vinicius. Minha avó era irmã da avó de
Vinicius e ele sempre foi uma pessoa muito amada e querida na família. Ele é
uma referência”, afirmou.
“Pegamos artistas baianos porque era o
Vinicius Baiano que estávamos celebrando. Os filhos de Itapuã tiveram destaque
Tina Ribeiro, Morenas de Itapuã, Amadeu Alves e Firmino de Itapuã… estavam lá.
Stella Maris, Claudia Cunha, Alexandre Leão, Illy, Carla Visi representavam
nossa MPB genuinamente baiana – o mais autêntico do cenário alternativo de
Salvador. Sidney Magal encantou o público. O ator Dody Só, nosso querido Mestre
de Cerimônia, encantou e recitou Vinicius com o fervor que a noite merecia.
Recebi muitos abraços no final de moradores de Itapuã. E a praça estava bem
iluminada, além dos muros todos com textos de Vinicius, ficou lindo, grafite
com trechos das canções do poeta”, disse Luzia Moraes, toda cheia de orgulho.
Mas a capital ainda homenageia Vinicius
com a exposição “O Haver – Pinturas e Músicas para Vinicius”, em cartaz na
Caixa Cultural, que reúne telas inspiradas no poema “O Haver”, do poetinha.
“Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura/Essa intimidade perfeita com
o silêncio/Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo/Perdoai-os! porque
eles não têm culpa de ter nascido…”. Esse poema “O Haver”, foi publicado no
livro “O Jardim Noturno”, em 1962. Nomes como Chico Buarque e Paulinho da Viola
coassinam as obras na exposição.
No famoso restaurante Amado, a
homenagem foi dupla, a Vinicius e ao cantor e compositor Dorival Caymmi. A
cantora Ana Mametto apresentou um show intimista que revisitou os clássicos de
ambos os mestres. Alguns poetas de Salvador, como Elenilson Nascimento,
Capinam. Fernando B. Fontoura e outros declamaram poemas. Enquanto isso, pela
internet, o Multishow (multishow.com.br)
produziu a websérie “Mais Vinicius, Por Favor”, que estreou no dia 22/10,
terça-feira. Ao longo de seis episódios, exibidos sempre às terças, o
documentário vai mostrar o desenvolvimento de quatro versões de canções
compostas por ele, na ótica de quatro bandas: Mahmundi, Baleia, Ordinarius e
Facção Caipira. Além de todo processo criativo, a série também vai mostrar
entrevistas com pessoas que conheceram o artista, como suas filhas Georgiana e
Maria, o compositor Carlos Lyra, a cantora Miúcha, entre outros.
Boêmio inveterado, Vinicius de Moraes
era visto sempre com um copo de uísque na mão. Ele morreu em 9 de julho de
1980, em casa, após passar mal na banheira.
E junto com a poesia, as conversas com
amigos e o uísque, a grande paixão de Vinicius sempre foi as mulheres. Mulheres
negras, brancas, marrons. De todas as cores. Seus quase 67 anos de vida foram
um redemoinho de paixões. Casou-se nove vezes e teve cinco filhos, a quem
dedicou a maioria de seus poemas para crianças, como a famosa “Aquarela”,
que Toquinho musicou.
Um de seus grandes companheiros de
farra, parcerias musicais,brigas e o amigo que disse ter sentido a dor “mais
intensa” de sua vida na manhã de 9 de julho de 1980, quando encontrou Vinicius
sem vida na banheira de sua casa, na qual o poeta recebia visitas e criava.
Estavam compondo, cozinhando macarrões com ovos, a comida preferida do poeta, e
Vinicius decidiu tomar um banho e beber um uísque em sua banheira, a última
dose.
Curiosamente, dias antes da morte do
poeta, o jornalista Narceu de Almeida tinha feito a que seria sua
última entrevista, e perguntou a Vinicius sobre a morte. Vinicius, que já não
tolerava as restrições que os médicos impunham na comida e na bebida, declarou
que a morte o “preocupava”, mas, sobretudo pelas mulheres, pois sentiria “muita
pena” em deixá-las. “De uma maneira muito mais simples, como uma espécie de
saudade da vida, uma pena de deixar isso aqui com todas as cagadas e confusões,
porque sempre vivi dentro de uma grande plenitude. Sobretudo por causa das
mulheres: tenho muita pena de deixá-las”, disse.
É escritor, poeta, blogueiro, meio jornalista e ex-professor baiano. Teve o livro “Memórias de um Herege Compulsivo” lançado em Portugal e que também participou da “XVIII Feria Internacional Del Libro de Lima” (Peru). Lançou 2013 a “I Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos”, que acabou sendo indicada ao “4º Prêmio de Literatura Contemporânea”.
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Luzia Moraes, Dody Só e Carla Visi |
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Gessy Gesse, Helô Pinheiro e Carla Visi |
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Gessy Gesse, Helô Pinheiro e Magal |
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Luzia Moraes, Stella Maris, Claudia Cunha, Illy, Carla Visi e Dody Só, no Centenário de Vinícius de Moraes |
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Gessy e o artista plástico Menelaw Sete |
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Na Praça |
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Claudia Cunha
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Fotos: Luzia Moraes, Rocharte/divulgação
Fonte texto e fotos:http://homoliteratus.com/vinicius-forever/
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