O impacto do aquecimento global será
"grave, abrangente e irreversível", segundo um relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, na sigla em inglês)
divulgado nesta segunda-feira.
Autoridades e cientistas reunidos no
Japão afirmam que o documento é a avaliação mais completa já feita sobre o
impacto das mudanças climáticas no planeta.
Integrantes do IPCC dizem que até
agora os efeitos do aquecimento são sentidos de forma mais acentuada pela
natureza, mas que haverá um impacto cada vez maior sobre a humanidade.
Mudanças climáticas vão afetar a
saúde, a habitação, a alimentação e a segurança da população no planeta,
segundo o relatório.
O teor do documento foi alvo de
intensas negociações em reuniões realizadas em Yokohama. Este é o segundo de
uma série de relatórios do IPCC previstos para este ano.
O texto afirma que a quantidade de
provas científicas do impacto do aquecimento global dobrou desde o último
relatório, lançado em 2007.
"Ninguém neste planeta ficará
imune aos impactos das mudanças climáticas", disse o diretor do IPCC,
Rajendra Pachauri, a jornalistas nesta segunda-feira.
O secretário-geral da Associação
Mundial de Meteorologia, Michel Jarraud, disse que se no passado as pessoas
estavam destruindo o planeta por ignorância, agora já não existe mais esta
"desculpa".
Enchentes e calor
O relatório foi baseado em mais de
12 mil estudos publicados em revistas científicas. Jarraud disse que o texto é
"a mais sólida evidência que se pode ter em qualquer disciplina
científica".
Nos próximos 20 a 30 anos, sistemas
como o mar do Ártico estão ameaçados pelo aumento da temperatura em 2 graus
Celsius. O ecossistema dos corais também pode ser prejudicado pela acidificação
dos oceanos.
"Ninguém neste planeta ficará
imune aos impactos das mudanças climáticas"
Rajendra Pachauri, diretor do IPCC
Na terra, animais, plantas e outras
espécies vão começar a "se deslocar" para pontos mais altos, ou em
direção aos polos.
Um ponto específico levantado pelo
relatório é a insegurança alimentar. Algumas previsões indicam perdas de mais
de 25% nas colheitas de milho, arroz e trigo até 2050.
Enquanto isso, a demanda por
alimentos vai continuar aumentando com o crescimento da população, que pode
atingir nove bilhões de pessoas até 2050.
"Na medida em que avançamos [as
previsões] no futuro, os riscos só aumentam, e isso acontecerá com as pessoas,
com as colheitas e com a disponibilidade de água", disse Neil Adger, da
universidade britânica de Exeter – outro cientista que assina o relatório.
Enchentes e ondas de calor estarão
entre os principais fatores causadores de mortes de pessoas. Trabalhadores que
atuam ao ar livre – como operários da construção civil e fazendeiros – estarão
entre os que mais sofrerão. Há também riscos de grandes movimentos migratórios
relacionados ao clima, além de conflitos armados.
Quem paga?
Em lugares como a África, as pessoas
estarão particularmente vulneráveis. Muitos que deixaram a pobreza nos últimos
anos podem voltar a ter condições de vida miseráveis.
O que é o IPCC?
A função do Painel
Intergovernamental da ONU para Mudanças Climáticas (IPCC), nas suas palavras é
"suprir o mundo com visões científicas claras sobre o estado atual do
conhecimento em mudanças climáticas e seus potenciais impactos ambientais e
socioeconômicos".
Com o aval da ONU, a entidade já
produziu quatro grandes relatórios até hoje.
O IPCC é uma organização pequena,
sediada em Genebra e com uma equipe de 12 funcionários que trabalham em turno
integral. Todos os cientistas que colaboram com o painel o fazem de forma
voluntária.
Mas o professor Saleemul Huq, outro
coautor do relatório, disse que os países ricos não estarão imunes.
"Os ricos terão que se preparar
para as mudanças climáticas. Estamos vendo isso agora na Grã-Bretanha, com as
enchentes de poucos meses atrás, as tempestades nos Estados Unidos e a seca no
Estado da Califórnia", disse Huq.
"Estes eventos são
multibilionários, que precisam ser pagos pelos ricos, e existe um limite no que
eles podem pagar."
Outro coautor, Chris Field, apontou
que existem alguns lados positivos do relatório. Segundo ele, o mundo tem
condições de administrar os riscos previstos no documento.
"Aquecimento global é algo
muito importante, mas nós temos muitas ferramentas para lidar de forma
eficiente com isso. Só é preciso lidar de forma inteligente com isso", diz
Field.
Mas um dos problemas que ainda não
tem resposta é: quem pagará a conta?
"Não cabe ao IPCC definir
isso", disse José Marengo, cientista brasileiro do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe), que participou das negociações em Yokohama.
"O relatório fornece a base
científica para dizer que aqui está a conta, alguém precisa pagar, e com essas
bases científicas é relativamente mais fácil ir às negociações da UNFCCC
[Convenção Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas] e começar a costurar
acordos sobre quem pagará pela adaptação [do planeta]."
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Participe, opine, colabore, construa. Faça parte desse "universo".